Saiba como avaliar o trabalho de seu representante no Legislativo
Fonte: O Estado de S. Paulo
O Movimento Voto Consciente, que há anos monitora o trabalho dos vereadores paulistanos e dos deputados estaduais paulistas, quer difundir sua tecnologia de avaliação de parlamentares, para que outras entidades ou indivíduos façam esse tipo de fiscalização.
Leia a seguir entrevista do cientista político Humberto Dantas, organizador do livro, professor do Insper, colunista da rádio Estadão e pesquisador do Voto Consciente:
Já há data prevista para que o sistema de acompanhamento parlamentar comece a funcionar?
Nós nos preocupamos mais com o livro, pois o objetivo é inspirar os cidadãos e fazê-los começar a agir em benefício de um olhar atento para os seus parlamentos mais próximos. O sistema deve estar no ar em cerca de dez dias e será um mero instrumento para a imputação de números aferidos pelos usuários-leitores. Enquanto isso, esperamos contagiar as pessoas com o livro, inspirando o acompanhamento.
Quem deve fazer esse tipo de acompanhamento, indivíduos ou organizações?
As listas geradas a partir da leitura do livro e da utilização do sistema sempre carregarão consigo o nome da organização responsável e/ou da pessoa responsável pelo trabalho no cabeçalho. É possível afirmar que organizações têm mais fôlego para a realização da ação e mais credibilidade, pois institucionalizam o desafio. Nesse caso, esperamos que jornais, rádios, ONGs, escolas, faculdades e associações em geral façam esse trabalho. O resultado pode ser informativo, no caso da mídia, e formativo no caso das escolas, por exemplo. Já imaginou o valor desse trabalho para um programa de política na rádio? E o valor educativo para alunos do ensino médio, ou de faculdades, orientados por professores? Mas nada impede que um cidadão comum desenvolva a análise e dissemine sua lista entre seus amigos. Perceba: não ha limites para o bom uso de uma ferramenta dessa natureza, que aproxima o cidadão comum de seus parlamentares.
A que se deve a opção de deixar a cargo do avaliador a escolha dos critérios? Com critérios pré-definidos e unificados a avaliação não seria mais fácil?
Esse é o grande diferencial desse livro, mas o avaliador não é 100% livre, existem limites colhidos em longa pesquisa realizada para a construção do livro. A liberdade é simples de ser compreendida. O Movimento Voto Consciente recebe consultas de todo o Brasil sobre seus métodos. Se olharmos para o grupo que age na Câmara Municipal de São Paulo, veremos que a história e a experiência de nossos voluntários resultou em critérios que se adequaram à realidade daquela casa e do grupo que lá atua. Na Assembleia Legislativa de São Paulo o grupo é outro, a casa é outra e os critérios são distintos. O mesmo se aplica a Jundiaí, Santos etc. Agora pensemos numa cidade pequena com um parlamento composto por nove vereadores. Quando alguém de lá nos pergunta: como avaliar meus parlamentares? Temos o direito de responder de uma forma unilateral adequada ao legislativo paulistano e seus 55 membros? Ou aos 94 deputados estaduais de São Paulo? Por isso demos certa liberdade. E olha que temos limitações em nosso trabalho. Resumimos tudo a questões de caráter prioritariamente quantitativo, e sabemos que o Parlamento carrega relações políticas difíceis de serem medidas sem qualificações. Indicadores sempre se comprometerão com parcelas de um fenômeno, nunca com ele todo – veja o IDH, por exemplo. Mas sabemos que a possibilidade de um olhar, da criação de uma rotina e do comprometimento com o Parlamento são aspectos que auxiliam no aprimoramento da democracia. E é isso que queremos, cidadãos próximos daquilo que é deles, se apropriando de nossa ferramenta e a utilizando até o limite em que pensarem: conhecemos melhor nosso Parlamento e chegou a hora de ir além desse trabalho sugerido. Ótimo! Teremos cumprido nossa parte.
O livro mostra que, para cada critério de avaliação escolhido, há vantagens e desvantagens. A escolha de uns ou outros será, portanto, subjetiva. Isso não impediria uma avaliação objetiva do trabalho parlamentar?
Não existe ranking que não carregue subjetividade, isso apreendemos nas Ciências Econômicas. O intuito de mostrar as vantagens e desvantagens está mais associado à honestidade do trabalho e, sobretudo, ao fato de que sempre somos questionados sobre nossos critérios por quem não alcança boas posições. E sempre somos sinceros em dizer: não gostou? A nossa forma é apenas uma das quase infinitas maneiras possíveis de olharmos para mandatos. Ademais, apontar aspectos positivos e negativos aprimora e amadurece o debate. E é isso que queremos. Entre não fazer nada, porque sempre existirá um problema, e fazer alguma coisa, optamos pela segunda alternativa.
O Movimento Voto Consciente teme o uso eleitoral das notas atribuídas aos parlamentares, por parte daqueles em busca de promoção?
O Voto Consciente sempre conviveu com esse uso: quem vai bem em nossas avaliações costuma propagandear a conquista. Isso é sinal de nossa credibilidade. Nesses casos, reconhecemos que sempre tivemos o controle das listas, feitas com informações colhidas por nossos voluntários. A partir de agora oferecemos um método e um sistema, mas é apenas isso. Nas listas geradas pelos usuários haverá frase dizendo que não somos (Voto Consciente) responsáveis pela disseminação de informações falsas, mas sim responsáveis pela oferta de um método. O cidadão e/ou organização responsável pela lista sempre terá seu nome divulgado no PDF gerado por nosso sistema. Isso é fundamental de ser observado. Assim, o usuário tem que se responsabilizar pelas informações que coletou e sistematizou. Por fim, pode vir a pergunta: e se o usuário utilizar exclusivamente variáveis em que sabe que um dado parlamentar pode ser prejudicado ou favorecido? Que fique claro que este será um dos modos de promover a análise. Se as informações forem verdadeiras (e elas precisam ser), méritos do representante. Mas que fique muito claro: as variáveis aparecem na lista e o cidadão, de posse desse documento, pode dizer que não concorda com as variáveis escolhidas – e por isso é importante escolher – e com os pesos atribuídos pelo responsável. Teremos cidades onde existirão guerras de listas e avaliações? Espero que sim, sinceramente. Pois não existe nada mais gratificante para o Voto Consciente que o fervor em torno de um Parlamento. O fervor benigno do debate e da atenção que o Parlamento merece. Ademais, é importante salientar: as informações que compõem as listas serão, em grande parte, solicitadas por meio dos princípios gerais da Lei de Acesso à Informação. É bom, nesses casos, que os legislativos comecem a se organizarem melhor em relação aos seus dados, pois o projeto pode mirar no que viu e acertar no que não viu, ou seja, na necessidade urgente de tratarmos bem as informações de interesse público.