Andréia Pereira e Vinicius Alvarez, da Legisla Brasil

 

Na Legisla, organização suprapartidária e sem fins lucrativos, trabalhamos com os bastidores da política e por isso acompanhamos as principais discussões das casas legislativas do país. Aqui também acreditamos que, olhando para as melhores práticas que têm sido implementadas para o fortalecimento do legislativo no mundo, vamos conseguir aprimorar nossa realidade e avançar como democracia. Assim, vamos compartilhar o que pudemos aprender com algumas dessas experiências que conhecemos recentemente.

Você sabia que as casas legislativas no Brasil, especialmente as de cidades com maior número de habitantes, possuem estruturas e recursos para a contratação de equipe de apoio para o parlamentar eleito? Essa estrutura consolidada colabora para que os parlamentares potencializem o trabalho realizado em seus gabinetes. Já na Índia, a situação é um pouco diferente. Uma das organizações que conhecemos é o PRS Legislative Research, que nasceu justamente porque os parlamentares na Índia têm recursos quase inexistentes para a contratação de uma equipe, fazendo com que tenham pouco tempo e expertise para se aprofundarem nas pautas. Um dos trabalhos do PRS, além de inserir profissionais nos gabinetes, também é promover debates qualificados sobre os projetos de lei, aprimorando as discussões sobre políticas públicas no país. Consideramos uma abordagem interessante e que combina dois elementos distintos de como uma organização pode influenciar no debate público.

Além da parte mais formal de estruturação das equipes, existe outro ponto crucial para qualquer organização: a seleção de pessoas. Outra iniciativa que conhecemos foi o College to Congress, organização norte-americana sem fins lucrativos que se dedica a recrutar e inserir jovens com alto potencial para promover um Congresso mais inclusivo e eficaz. Além de treinamento para os jovens selecionados, eles também oferecem suporte financeiro, uma vez que os estágios não são remunerados – ou são mal pagos -, o que dificultaria que um jovem em situação de vulnerabilidade econômica pudesse se sustentar e arcar com os custos de vida em Washington. Iniciativas como o PRS e o College to Congress mostram a necessidade e a demanda de gabinetes parlamentares em atrair os melhores talentos para o universo legislativo com o objetivo de resolverem problemas públicos.

Um fato curioso é que o College to Congress surgiu em um período próximo ao da Legisla, endereçando a mesma dor. Ambas as organizações trabalham de forma dedicada a possibilitar o ingresso de jovens em gabinetes parlamentares, os subsidiando de diferentes formas a desempenharem seu potencial. Tivemos a oportunidade de trocar ideias sobre os desafios dos nossos trabalhos com as duas entidades e é gratificante encontrar organizações parecidas com a Legisla, cujos objetivos passam pela promoção de um Legislativo melhor.

E não se trata de ter apenas os profissionais mais capacitados. É importante que eles sejam complementares. Falta diversidade em todos os sentidos: renda, etnia, gênero e orientação sexual. E, como o mundo corporativo já está descobrindo, essa não é uma pauta política particular ou exclusiva; quando queremos ter assertividade nas nossas decisões, especialmente na democracia, é muito importante que as pessoas que estão com a caneta na mão tenham vivências diversas. Entendemos que a principal causa dessa falta de oxigenação no Legislativo é também similar ao mundo corporativo: as pessoas que têm o poder decisório no momento de contratação acabam não levando em consideração este fator, fazendo com que um ciclo vicioso de homogeneidade de backgrounds exista na organização. Neste sentido, iniciativas como da organização Representative Democracy, uma coalizão norte-americana de think tanks, organizações suprapartidárias, profissionais e grupos de direito civil que promovem a diversidade com o objetivo de fortalecer a democracia, trabalham para que práticas de diversidade sejam implementadas no ambiente de trabalho do Congresso norte-americano. A visão de partida é o entendimento que a formulação de políticas públicas precisa atender uma sociedade multifacetada e isso passa por equipes parlamentares que precisam ser diversas e inclusivas para refletir tal sociedade.

Um outro ponto que vimos como essencial na busca da profissionalização legislativa é o uso da tecnologia, em especial da ciência de dados, para se identificar demandas e percepções da população. A questão é que a implantação de tais soluções na política brasileira – que dirá mundial – é tão disruptiva que pouca gente sabe por onde começar. Uma das experiências que podem nos servir de inspiração nessa temática é o guia Modernizing Congress, do Beeck Center da Universidade de Georgetown, nos Estados Unidos. Produzido a partir de estudos de casos práticos sobre como implementar de forma personalizada e robusta a ciência de dados nos gabinetes parlamentares, o guia nos dá exemplos de como mandatos de congressistas norte-americanos encontraram novas maneiras de estabelecer conexões com a população de seus distritos por meio da tecnologia. Ao longo dos estudos, os pesquisadores descobriram que gabinetes que usam a tecnologia de forma eficiente conseguem ser muito mais próximos da população local com menos recursos despendidos do que antes. Falta, agora, que tenhamos não somente profissionais para implementarem estas soluções no Brasil, mas também capacidade institucional para estabelecer uma cultura e método para uso da tecnologia dentro de gabinetes.

Observando o panorama geral das experiências que compartilhamos, está claro que existe um ecossistema ativo e em ebulição quando se trata da profissionalização de mandatos parlamentares ao redor do mundo. Não existe qualificação da democracia e do debate público sem o fortalecimento do Poder Legislativo. Ficamos felizes com tantas experiências que podem nos servir de inspiração, mas que, acima de tudo, nos mostram que existem um olhar cuidadoso para ampliarmos o potencial, o impacto e a importância do parlamento para o desenvolvimento de uma nação.