Vítor Sandes e Raul Bonfim 

Nos últimos anos, o processo de formulação e aprovação do orçamento federal têm sido recorrentes nos principais meios de comunicação. A centralidade do debate sobre o orçamento federal é instigada por dois motivos: os cortes periódicos promovidos pelo governo federal na proposta aprovada e a ampliação dos poderes do relator-geral a partir de suas emendas orçamentárias à Lei Orçamentária Anual – LOA. Ambos os motivos se traduzem na incapacidade do Executivo em elencar prioridades e, consequentemente, transferir para outros atores políticos aquelas prerrogativas sobre o orçamento que seriam suas por natureza constitucional.

Para o orçamento aprovado para 2022 isso não foi diferente. A proposta final confirmada pelo Congresso Nacional referente aos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social somava 102,4 bilhões de reais; deste total, o Executivo vetou 3,18 bilhões de reais. Em um primeiro momento, esses valores parecem pequenos frente a totalidade aprovada. Afinal, eles representam 3,1% do montante geral. Todavia, os vetos se concentraram em áreas essenciais para desenvolvimento social e econômico do país. É válido lembrar de que o plano de governo apresentado pelo então candidato Jair Bolsonaro (atualmente filiado ao PL) durante a campanha eleitoral de 2018 destacava como uma de suas prioridades o aumento de recursos para o Ensino Básico (ensino infantil, fundamental e médio).

Quando verificamos os vetos ao orçamento de 2022, os Ministérios da Educação e do Trabalho e Previdência foram os que mais perderam recursos (739,8 milhões e 1 bilhão de reais, respectivamente).[1] Em suma, sem priorizar no orçamento áreas como educação e trabalho, por exemplo, o governo não consegue garantir condições financeiras para a materialização de políticas públicas essenciais, sobretudo, em um contexto que demanda maior atuação do Estado. É válido destacar que outras áreas também já sofreram cortes orçamentários neste ano, como saúde, infraestrutura, dentre outras.

Olhando os vetos ao orçamento para o Ministério da Educação de forma mais desagregada, verifica-se que a Unidade Orçamentária (UO) que mais perdeu recursos corresponde ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) que, ao todo, teve seus montantes reduzidos em quase 500 milhões de reais (R$ 499.003.668). Paralelamente, a ação orçamentária “Apoio ao Desenvolvimento da Educação Básica” foi a que sofreu maiores cortes (324,7 milhões de reais), que correspondem a 35,5% do total aprovado pelo Legislativo para esta ação.

Em um primeiro momento, esses vetos poderiam ser interpretados como uma resposta do governo à insuficiência de receitas para garantir a execução dessas despesas aprovadas. Porém, essa não é a realidade. Vale lembrar que a PEC dos precatórios abriu espaço no orçamento para que o governo incluísse novas despesas. Não é à toa que, para este ano, estão previstos R$ 16,5 bilhões para emendas de relator-geral. Ao mesmo tempo, os valores totais autorizados (previsão de gastos) para investimentos atingiram seu patamar mais baixo nos últimos 10 anos (R$ 43 bilhões). Ressalta-se que as emendas de relator podem criar novas despesas, dissipando parte das prioridades da proposta original do governo.

Ao abdicar da formulação de uma agenda orçamentária condizente com as prioridades da população, enquanto delega ao Legislativo parte de suas atribuições sobre orçamento, especialmente sua capacidade de definir os investimentos prioritários, o Poder Executivo caminha na contramão de seu papel institucional fixado na Constituição Federal: planejar e elaborar políticas públicas de acordo com os anseios coletivos do país. Sem prioridades, sem criar as condições para implementar políticas públicas em áreas sensíveis, sobretudo em um contexto pandêmico, prevalecem os interesses não republicanos e de curto prazo.

[1] Joyce Luz já discutiu os cortes orçamentários na área educação na LOA deste ano em artigo publicado neste blog em 25 de janeiro.  https://votoconsciente.org.br/2022/01/25/educacao-um-direito-de-todos-e-uma-nao-prioridade-do-governo-federal/

Créditos da imagem: Ueslei Marcelino/Reuters