Vítor Sandes

O Brasil comemorou ontem, 7 de setembro, 200 anos de independência. A data representa um marco para o desenvolvimento de um Estado e de um governo autônomos e em bases constitucionais.

A história brasileira que se segue a partir da independência foi ancorada na escravidão e na desigualdade social. A partir da Independência, a monarquia se instalou e perdurou até 1889, mesmo muitas vezes questionada. Um ano antes, em 1888, a escravidão foi, definitivamente, proibida no país. As raízes escravistas e o racismo estrutural, no entanto, perduraram e perduram até hoje.

A independência e a soberania nacional, conquistadas há 200 anos, não foi transformada em liberdades e direitos a toda a população brasileira. Vivemos períodos extremamente oligárquicos e não democráticos, como da República Velha, bem como de períodos autoritários, como do Estado Novo (1937-1945) e do Regime Militar (1964-1985).

A democracia foi uma conquista tardia. A partir de 1946, tivemos nossa primeira experiência, encerrada com o golpe de 1964. O regime democrático retornou somente nos anos 1980. O primeiro grande marco do seu retorno aconteceu em 1985, quando um presidente civil assumiu o poder, após anos de governos militares e, de forma definitiva, com a promulgação da nova Constituição, em 1988. Nela foi instituído o Estado Democrático de Direito, tendo como fundamentos: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e, finalmente, o pluralismo político.

Esses fundamentos norteiam toda nossa vida democrática no país. Mas eles só podem ser garantidos quando o Estado e seu governo atuam e constroem políticas nesse sentido. Enquanto a pobreza e a desigualdade social histórica se agravam no país, ontem, muitos aproveitaram a data comemorativa dos 200 anos de Independência, para se manifestarem a favor da intervenção militar e, consequentemente, pelo fim da democracia no país. A manifestação não é um ato isolado. Tem sido recorrente, nos últimos anos.

Todos os avanços no sentido de retrocessos à democracia caminham no sentido contrário aos avanços sociais. É no contexto democrático que podemos visibilizar os problemas sociais, que “invisíveis” se tornam visíveis, que políticas públicas podem atingir seus fins, que o Legislativo, o Executivo e o Judiciário podem atuar, conjuntamente, no sentido de construir, em conjunto com a sociedade civil, um país mais inclusivo e que garanta dignidade a todos os seus cidadãos.

A democracia brasileira é o resultado de um trabalho árduo e, por isso, cabem às instituições e aos cidadãos o papel de lutarem pela manutenção e fortalecimento do regime. É a democracia que garante aos cidadãos a possibilidade de escolher os melhores projetos e representantes para o país e de acompanharem de perto se as políticas públicas promovidas pelos governos buscam resolver as desigualdades sociais que são estruturais e históricas no país.

Créditos da imagem: MST