Luciana Santana

Em 2015, o Brasil assinou junto com outros 192 países participantes da Conferência da ONU o compromisso de cumprir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), com metas a serem alcançadas até 2030. Dentre os 17 objetivos listados na carta compromisso, o objetivo 5 trata da igualdade de gênero e empoderamento de todas as mulheres e meninas. Para isso, foram estabelecidas metas a serem atingidas pelos países.

Em relação ao Brasil, uma das metas trata diretamente de um tema de interesse da ciência política, a participação das mulheres na política. A quinta meta busca garantir a participação plena e efetiva das mulheres e a igualdade de oportunidades para a liderança em todos os níveis de tomada de decisão na vida política, econômica e pública. Considerando que a participação plena e efetiva, bem como a igualdade de oportunidade de mulheres na política passa pelo aumento de representatividade das mulheres nos legislativos e governos.

No capítulo escrito por Biroli et al no Livro “Eleições 2022 e a reconstrução da democracia no Brasil”  (2023) são apontados vários desafios para melhorar a representação política no Brasil, na questão de gênero e raça: garantir que os partidos cumpram a legislação eleitoral, garantir competitividade para as candidaturas femininas (acesso ao financiamento e visibilidade das candidaturas) e políticas de combate à violência política de gênero.

E qual a situação atual do Brasil? Quantas mulheres estão nos espaços de representação política?  Apesar da maioria da população e do eleitorado no Brasil serem mulheres (52%), a representação de  mulheres em espaços de tomada de decisão ainda é majoritariamente masculino, tanto nos legislativos, quanto nos Executivos. Em relação ao legislativo, por exemplo, de acordo com o ranking da presença de mulheres nos parlamentos realizado pela Inter-Parliamentary Union, o Brasil ocupa a 130a. posição entre 190 países, atrás de países latino-americanos como Equador, Peru, Paraguai, Chile, Colômbia, Uruguai, Argentina, dentre outros.

Não podemos negar pequenos avanços a cada eleição, especialmente com o aumento de candidaturas de mulheres. Mas o sucesso eleitoral de mulheres ainda não é proporcional aos incentivos institucionais adotadas no país nos últimos anos, tais como a cota de gênero (Lei 9.504/97) que determina a presença de pelo menos 30% de um dos gêneros nas cotas dos partidos, ou a obrigatoriedade de repasse do Fundo Eleitoral de forma proporcional ao percentual de mulheres candidatas.

De acordo com dados do TSE, na eleição municipal de 2020, foram eleitas apenas 16% de vereadoras e 12% de prefeitas. A situação não foi muito diferente na eleição estadual na eleição de 2022, com apenas 18% de deputadas estaduais ou distritais em todo o país. Nos executivos estaduais, a situação é mais dramática para as mulheres, com apenas 2 governadoras eleitas, representando 7% de mulheres no cargo. A renovação do Senado Federal foi de apenas ⅓ , e dentre os 27 cargos em disputa, apenas 4 senadoras foram exitosas na disputa por esses espaços.

O aumento na representação de mulheres na Câmara dos deputados, que saiu de 77 deputadas (14%) em 2018 para 91 (18%) em 2022, é um resultado positivo, mas não tão animador para o tamanho dos desafios que a bancada feminina precisa enfrentar para aprovar uma agenda políticas públicas necessárias para proteger e melhorar a vida de mulheres, especialmente as que vivem em condições de maior vulnerabilidade social.

Dentre as prioridades da bancada feminina na Câmara dos deputados estão temas que estão em consonância com os ODS, tais como a aprovação do Plano Nacional de Prevenção e Enfrentamento à Violência contra a Mulher como instrumento de implementação da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS), Programa de Saúde Menstrual (Lei 14.214/21), que determina que as cestas básicas entregues no âmbito do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) deverão conter absorvente higiênico feminino; a Lei 14.232/21, que institui a Política Nacional de Dados e Informações relacionadas à Violência contra as Mulheres (Pnainfo); a lei de violência política contra a mulher (Lei 14.192/21), que acabou de completar um ano, mas necessita que sejam ampliados os mecanismos de denúncia, investigação e punição para esses tipos de violência; e a Lei 14.316/22, que destina recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) para ações de enfrentamento da violência doméstica contra a mulher. Soma-se também o projeto de lei que deve ser apresentado pelo governo federal que busca a equiparação salarial entre homens e mulheres no país.

Se há desafios na arena eleitoral para melhorar a representatividade da mulher na política, há também tantos outros no interior do Legislativo. Na eleição para a nova mesa diretora (2023-2025), por exemplo, apenas uma deputada foi eleita para ocupar um dos cargos, a deputada Maria do Rosário (PT/RS), a segunda secretaria da Casa. A situação no Senado ainda é pior, nenhuma mulher foi eleita para a mesa diretora. Considerando o papel dos partidos na composição das mesas, é factível afirmar que assim como na arena eleitoral, os partidos são obstáculos à ampliação da participação da mulher nas instâncias de tomada de decisões no Legislativo.

Uma situação bastante lamentável ante um cenário que demanda maior protagonismo das mulheres. Torna-se primordial e urgente que deputadas ocupem cargos estratégicos nas Casas Legislativas em todos os níveis, seja na mesa diretora, presidências de comissões e relatorias, participação em Colégio de Líderes, quando houver.

No entanto, fica cada vez mais evidente que melhorar a representatividade da mulher na política passa necessariamente por um processo de sensibilização das lideranças partidárias em todo o país sobre a importância das mulheres nos espaços de decisão. O desafio é muito grande, mas não podemos desanimar. Adelante, mulheres!