Lara Mesquita

O cenário de reeleições nas mesas diretoras legislativas tem sido um tópico importante nos últimos anos, tendo sido objeto de análise do Supremo Tribunal Federal (STF) em mais de duas ocasiões nos últimos 4 anos. A ausência de limite aos mandatos dos líderes das casas legislativas suscita preocupações quanto à necessidade de limites para evitar concentração de poder em um único indivíduo.

Primeiro foram as duas casas que compõem o congresso nacional, Câmara e Senado, que tentaram mudar a regra do jogo para permitir que seus presidentes permanecessem por mais tempo nos cargos. A iniciativa foi derrubada em dezembro de 2020 quando o STF finalizou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6524, proposta pelo PTB, que questionava a possibilidade de, por alteração do regimento interno das casas, permitir que seus presidentes se reelegessem numa mesma legislatura.

A decisão do STF foi baseada no que diz o Art. 57 da Constituição Federal de 1988, que estabelece em seu § 4º “Cada uma das Casas reunir-se-á em sessões preparatórias, a partir de 1º de fevereiro, no primeiro ano da legislatura, para a posse de seus membros e eleição das respectivas Mesas, para mandato de 2 (dois) anos, vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”.

Para que o presidente e os demais membros das mesas diretoras da Câmara e do Senado possam se reeleger na mesma legislatura será necessário que se mude a constituição, até lá, nada feito.

Em dezembro de 2022 foi a vez de a corte de manifestar sobre os limites para a reeleições dos membros das mesas diretoras dos legislativos estaduais. Foram 9 ADIs analisados no julgamento que concluiu, em acordo com a decisão tomada 2 anos antes sobre as casas legislativas federais, que só cabe uma reeleição ou recondução dos membros das mesas diretoras. Nesse caso o STF decidiu que a reeleição está limitada independentemente de os mandatos consecutivos se referirem à mesma legislatura.  A decisão foi referendada em abril desse ano, quando o STF analisou o caso de Roraima (ADI 6654) e manteve a decisão anterior. Em maio desse ano foi a vez do STF suspender a eleição antecipada da mesa diretora para o segundo biênio da atual legislatura, iniciada em fevereiro.

Ao que tudo indica o Supremo muito em breve terá que se debruçar uma vez mais sobre o tema das eleições e reeleições das mesas diretoras do poder legislativo, mas dessa vez com foco nos legislativos municipais.

Na véspera do feriado de finados, última quarta-feira, a Câmara Municipal de São Paulo (CMSP) aprovou, com apoio de 46 dos 55 vereadores da casa, mudança na Lei Orgânica do município pondo fim ao limite de reeleições para os membros de sua mesa diretora, incluído aí seu presidente. Para a votação o presidente da Câmara  e seus apoiadores se aproveitaram de uma proposta de emenda à Lei Orgânica de 1992 que estava adormecida nos arquivos da CMSP.

Antes disso, em 2022, A CMSP já havia alterado a Lei Orgânica para permitir 3 mandatos consecutivos: Art. 26 “O mandato da Mesa será de um ano, permitidas duas reeleições para o mesmo cargo”.

O atual presidente da Câmara Municipal de São Paulo, Milton Leite (União Brasil) está em seu quinto mandato na presidência da mesa diretora, o terceiro consecutivo (2017 e 2018, 2021 2022 e 2023), e pode seguir para o quarto mandato consecutivo em 2024. A seguir nessa toada não demorará muito para que Leite baterá o recorde de José Getúlio Monteiro, que presidiu a CMSP por 6 anos, entre janeiro de 1902 e janeiro de 1908.

Considerando apenas o período democrático recente (1985 em diante), até a mudança de 2022, os mandatos mais longevos tinham sido as presidências de Antônio Carlos Rodrigues (janeiro de 2007 a janeiro de 2011) e do próprio Milton Leite (janeiro de 2021 a janeiro de 2023), mas em ambos os casos com uma mudança de legislatura que permitia a permanência por maior período a frente do cargo.

Estão abertas as bolsas de apostas: o STF será provocado e analisará o caso da reeleição sem limites no legislativo paulistano antes que Leite se reeleja para o quarto mandato consecutivo ou só depois? Será o PSOL, o único partido que votou contra o fim do limite para reeleição da mesa diretora na CMSP que acionará o supremo, ou outro partido liderará esse processo?

Em um sistema democrático, é vital garantir a alternância de poder e evitar a perpetuação de lideranças nas mesas diretoras legislativas, o que pode prejudicar o equilíbrio entre os poderes e a representação necessária para um funcionamento eficaz da jovem e ainda combalida democracia brasileira.