Como avaliar a qualidade de um representante?
Paulo Franz, doutor em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná e pesquisador de pós-doutorado no INCT ReDem.
A crise de representação política é um fenômeno observado em diversos países, incluindo o Brasil, onde a desconfiança na classe política e nas instituições democráticas tem aumentado. A insatisfação popular reflete uma percepção generalizada de que os parlamentares não estão cumprindo adequadamente suas funções de representar os interesses dos cidadãos. Esse cenário leva à necessidade de repensar e aprimorar os mecanismos de avaliação da qualidade da representação política para resgatar a confiança pública e fortalecer a democracia. Que atributos ou características deve possuir um bom representante? Como avaliar a qualidade de um deputado federal? Que critérios você utilizaria para afirmar que seu estado está sendo bem ou mal representado pelos seus parlamentares na Câmara dos Deputados?
É possível que, para a maioria das pessoas, a definição de bom ou mau representante passe pelas afinidades políticas entre eleitos e eleitores. Mas essa avaliação estaria longe de ser objetiva ou cientificamente orientada. O sufrágio universal traz desafios significativos para a representação de interesses e valores, na medida em que agrega diferentes perspectivas em uma única unidade política. Avaliar um deputado pelas suas afinidades políticas com a população de um distrito com milhões de eleitores, que elegem de 8 a 70 deputados – como é o caso brasileiro – seria ilógico. Da mesma forma, exigir que representantes tenham as mesmas características de raça, gênero ou classe que a população de um distrito pode incorrer em um pressuposto ingênuo de que pessoas de características semelhantes tenham os mesmos objetivos e princípios, ignorando que grupos sociais são marcados por diversidade interna de interesses e valores.
Por outro lado, se em vez das características, avaliarmos a atuação política do parlamentar, nos deparamos com outros dilemas. É preferível que o representante protagonize discursos e atos contra seus adversários, ou que ele priorize a eficiência administrativa através de diálogo e acordos com seus colegas de trabalho no Congresso Nacional? A interação entre elites políticas e seus apoiadores nas redes sociais indica uma predileção por performances mais “agonísticas” e barulhentas, nas quais os deputados se contrapõem explicitamente a políticos e projetos de outros espectros ideológicos. Contudo, uma série de evidências produzidas pelo Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), revelam que a influência de um parlamentar na Câmara, assim como a maior probabilidade de aprovação de seus projetos, passa pela maior disposição em dialogar, negociar e celebrar acordos com os demais membros da Casa.
Acusações de envolvimento de deputados em esquemas de corrupção parecem igualmente problemáticas de serem mobilizadas para avaliar a qualidade da representação, devido ao caráter político de denúncias e investigações, geralmente assinadas e protocoladas por membros de partidos adversários. Nesse sentido, o Congresso em Foco tem realizado um esforço em reconhecer os mandatos parlamentares com boas práticas de transparência, para além das prestações de contas obrigatórias estipuladas pela lei, como divulgação de agenda, publicação de gastos, detalhamentos dos custos de gabinete, uso frequente de redes sociais etc.
Embora seja tarefa complexa, o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia – Representação e Legitimidade Democrática (INCT ReDem) tem como objetivo central desenvolver métodos e ferramentas para uma avaliação objetiva e rigorosa da qualidade da representação parlamentar no Brasil, integrando diferentes critérios de avaliação, e oferecendo uma visão mais completa e precisa do desempenho dos parlamentares. Uma das iniciativas do ReDem é a criação de um índice que forneça uma medida abrangente da qualidade da representação.
Ao fornecer uma avaliação objetiva da atuação parlamentar, o ReDem contribui para aumentar a responsividade dos representantes eleitos e para promover uma maior confiança nas instituições democráticas. A crise de representação política no Brasil indica uma demanda pelo desenvolvimento de métodos rigorosos para avaliar a qualidade da representação parlamentar. Nesse sentido, o ReDem desempenha um papel inovador nesse contexto, ao buscar soluções integradoras que possam oferecer uma avaliação mais precisa e confiável do desempenho dos parlamentares.