Ana Claudia Farranha

 

É julho!!!

Tempo de férias escolares. Tempo de algumas festas julinas, por algumas regiões do Brasil.  E, tempo de recesso parlamentar. Também é um tempo que se pode refletir sobre matérias que não estão no “calor” da agenda, mas que certamente é importante ter estratégias para elas.

Assim, escolhi pensar sobre uma que recorta a arena pública brasileira desde sempre e que tem no Legislativo um dos seus lugares de disputa e consenso. Trata-se das possíveis reformas na organização e oferta dos serviços públicos. Em outras palavras: as reformas administrativas.

Basicamente, o Estado brasileiro conta com três grandes marcos relacionados às reformas administrativas: a criação do DASP em 1937, a criação do Decreto 200, em 1967 e a reforma dos anos 90, com criação do Plano Diretor da Reforma do Aparelho de Estado (PDRAE), em 1995. Mas, de lá para cá, o que aconteceu? Quais as principais propostas e discussões no Congresso Nacional? Como a iniciativa de organização de um concurso nacional unificado (CNU) ou a criação de uma comissão para revisão do Decreto 200 impactam nessa questão? Essas são algumas das questões que esse breve artigo procura apresentar.

Sobre o caminho das reformas administrativas ao longo dos últimos 30 anos é possível afirmar que a dinâmica social e política exige constantemente que a forma de organização das estruturas estatais, bem como dos serviços públicos sejam redesenhados. Assim, ainda que não se possa identificar um amplo movimento de reforma como o que ocorreu nos anos 90, articulado sob a batuta do que na literatura especializada é conhecido como “new public management” e nos círculos mais cotidiano é chamado de “novo gerencialismo”, é possível apontar instrumentos jurídico-político que promoveram alterações nos conhecidos formatos da estrutura estatal.

Um exemplo desse processo é a edição da nova lei de licitações e contratos ( Lei 14.133/2021) que substituiu a Lei 8.666/1993. Isso mostra que ainda que não haja uma profunda reforma no Estado, há sempre um movimento de mudanças no sentido de adequar estruturas públicas às demandas de uma realidade que vem mudando com uma velocidade intensa. Aqui, uma dica para quem pesquisa o tema é compreender essas mudanças pontuais em um contexto mais amplo que permita perceber para qual direção o Estado vai se inclinando: mais e melhores serviços públicos, ofertados com controle, qualidade e inclusão social; ou pura e simples delegação de competência, sem muita atuação (correções de rotas, monitoramento, participação social) sobre os resultados produzidos

Por outro lado, no ano de 2021 assistimos no Congresso Nacional o debate sobre a PEC 32/2020. Tratou-se de uma proposta de reforma administrativa, enviada pelo Poder Executivo que propunha mudanças centradas na regulamentação das relações de trabalho com o servidor, alterando artigos constitucionais que impactarão nos modelos de concurso, na estabilidade do servidor, cargos em comissão e desempenho funcional (Secchi et all, 2021). Essa proposta não foi votada e, também tramita no Congresso a PEC 199/1999, de autoria do ex-deputado Thiago Mitraud. Isso assinala que o tema continua orbitando na agenda, ainda que sem a efervescência que antecede mudanças institucionais como essas.

Outra iniciativa importante na seara deste debate é a atuação da Comissão Permanente de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados que recentemente organizou uma audiência pública (04/07), a partir do Requerimento nº 52, de 2024, do deputado Reimont (PT/RJ), cujo objetivo foi analisar as propostas legislativas do Conselho Nacional de Secretários de Administração (CONSAD) em busca de um possível alinhamento com as propostas em tramitação na Casa Legislativa Federal. Ressalto, que o tema transformação digital para oferta de serviço públicos foi muito destacado e, que a análise apresentada perpassa  as muitas experiências do nível sub-nacional, que em termos de reformas administrativas partem de realidades muitos diferentes e desiguais. Também para quem estuda  ou se interessa pelo tema, olhar esses contextos pode ser rico para compreensão da aplicação ( ou não) de princípios, conceitos e formatos relativos à estrutura estatal.

E, por fim, é digno de nota as ações implementadas pelo Ministério da Gestão e Inovação (MGI) com foco na mesma problemática. Destaco a implementação do Concurso Nacional Unificado, que se trata de uma proposta importante na seara das reformas, trazendo maior racionalidade e aproximação entre as carreiras no serviço público federal e, certamente, retomando pontos como desempenho, salários, heterogeneidade dos postos de trabalho e seus privilégios, entre outros. Destaco, também, a revisão do Decreto 200, que por meio de comissão de especialistas, revisa as formas de organização da Administração Pública. Em minha opinião, essa é uma medida em que temas como qualidade, controle e inclusão social na oferta de serviço públicos, podem ser amplamente debatidos e acredito que boas propostas virão.

Para concluir ( e voltarmos ao merecido descanso promovido pelo recesso de julho), tentei ao longo desse breve texto pontuar algumas iniciativas e eixos que podem ser ampliados e debatidos para além da esfera do Legislativo ou do Executivo. Nesse sentido, desejo que o tema da reforma estrutural ou mesmo pontual do Estado esteja presente nas rodas de conversa, comícios (sim, eleição municipal é um excelente lugar para falar disso), salas de aula, em toda sociedade, pois, parece-me que esse é um tema que toca a todos e todas nas pequenas e nas grandes demandas que se apresentam ao Estado brasileiro.