Planejando o orçamento em bases participativas: o “retorno” do Plano Plurianual (PPA)
Vítor Sandes e Raul Bonfim
A primeira etapa do ciclo orçamentário brasileiro é a elaboração do Plano Plurianual (PPA). Este é o principal instrumento de planejamento que define as metas, objetivos e diretrizes do governo para os próximos quatro anos. Considerando que Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eleito Presidente da República em 2022, pertence a uma orientação ideológica historicamente ligada à participação popular, e oposta àquela adotada pelo presidente anterior, Jair Bolsonaro (PL), o projeto de lei do PPA a ser apresentado ao Congresso Nacional este ano ganha ainda mais importância, pois será, por meio dele, que o Governo Federal apresentará as linhas gerais de suas principais políticas públicas, especialmente aquelas de grande porte.
O processo de construção de um PPA mais sólido ocorre em um contexto de bastante fragilização dos instrumentos de planejamento orçamentário. O PPA federal foi, durante muito tempo, rotulado como uma peça de ficção, tendo em vista o não cumprimento de suas diretrizes e metas, ou mesmo a ausência de indicadores realistas que permitissem monitorar a efetividade de seus programas. Paralelamente, o Congresso Nacional ganhou protagonismo no seu papel em propor alterações ao orçamento anual, além de ter um espaço bem mais relevante em indicar emendas parlamentares sem necessariamente se vincular às ações previstas no PPA, por meio das transferências especiais, instituídas em 2019, bem como o uso, pouco transparente, das emendas do relator-geral (declaradas inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal em 2022).
Em tese, um primeiro passo para tornar a proposta do PPA mais sólida é incluir a sociedade nesse processo. Em geral, a proposta do PPA (2024-2027) é exclusiva do Governo Federal, mas, desta vez, o Governo propôs um processo participativo, envolvendo diretamente a sociedade. Além da participação da sociedade civil organizada, por meio de plenárias que ocorrem de forma descentralizada, também é possível participar individualmente, por meio da Plataforma Brasil Participativo até o dia 14 de julho. Até o momento, quase 500 mil pessoas participaram do processo e mais de 4 mil propostas foram apresentadas. As propostas e programas com mais votos são analisadas pelo Governo, que elaborará a proposta final do PPA e enviará ao Congresso até 15 de agosto.
Além disso, o Governo Federal propôs um aperfeiçoamento metodológico do plano para garantir a efetividade das políticas indicadas. O novo manual do PPA determina, por exemplo, que além dos indicadores de resultados, os programas também irão contar com indicadores de objetivos específicos e de entregas, permitindo um monitoramento mais direto e eficaz das políticas públicas propostas. A medida é bastante salutar em um contexto em que o orçamento se tornou, em diversos momentos, sujeito a mudanças casuísticas.
O orçamento é o coração das políticas públicas e, por isso, a agenda do governo necessita da garantia de que haverá recursos e que eles serão destinados para as ações bem planejadas e que tenham um monitoramento efetivo, evitando o desperdício de recursos públicos escassos.
É válido destacar, entretanto, que cabe ao Congresso discutir, deliberar e aprovar a versão final do PPA, que será, consequentemente, executada. Este poderá, inclusive, rejeitar o que foi apresentado e incorporado à proposta do governo por meio da participação social. Assim, o Governo, por meio de sua articulação, deve criar as condições para que o planejamento elaborado em bases participativas seja, de fato, aprovado o mais próximo da proposta original do governo. Essas condições ainda não estão completamente dadas, pois os parlamentares costumam redesenhar as ações propostas para atender seus interesses políticos.
Créditos da imagem: Patrick Grosner