Ano ímpar é ano de Reforma Eleitoral
Lara Mesquita
Se alguém se der ao trabalho de contar quantos artigos publicados neste espaço do blog Legis-Ativo versam sobre Reforma Política/Reforma Eleitoral, a conta passaria uma dúzia sem dificuldade. E aqui estamos nós mais uma vez abordando esse tema.
Não há erro, se é “ano ímpar”, é ano de se discutir mudanças no sistema eleitoral. Neste ano, o debate começou em de março, quando foi protocolada Proposta de Emenda Constitucional (PEC 9/2023) que prevê o perdão os partidos que não cumpriram, no pleito de 2022, o preconizado pela Emenda Constitucional 117. A discussão continua no Senado, que se debruça sobre a proposta do Novo Código Eleitoral e atingirá seu ápice nas próximas semanas, ao longo do mês de setembro.
Na última semana, o presidente da Câmara dos Deputados instalou o Grupo de Trabalho da Minirreforma Eleitoral. O grupo é presidido pela deputada em primeiro mandato Dani Cunha (União Brasil-RJ) e relatado pelo deputado Rubens Pereira Jr. (PT-MA). O Plano de Trabalho do grupo, apresentado pelo relator na reunião do dia 24/08, elenca os seguintes “temas que já se mostram candidatos a ajustes, sem prejuízo de outras que se encaixem nas premissas do GT”:
- Federações Partidárias;
- Prestações de Contas;
- Propaganda Eleitoral;
- Regras do Sistema Eleitoral;
- Registro de Candidatura;
- Financiamento de campanha;
- Inelegibilidade;
- Violência Política contra a mulher.
Como se vê, a “Minirreforma” tem potencial de ser bastante ampla e pode alterar de forma substancial as regras para a competição eleitoral em 2024. No entanto, não é apenas a abrangência dos temas sobre os quais o grupo quer abordar que impressiona, mas também, e talvez principalmente, o cronograma que o grupo estabeleceu: audiências públicas serão realizadas entre 29 e 31 de agosto, e a apresentação do texto e deliberação interna no grupo correrão entre 04 e 06 de setembro. Se o cronograma for respeitado, após o feriado da Independência a proposta de reforma estará pronta para ser levada ao plenário da Câmara. Trata-se de um processo de debate amplo e inclusivo, onde todos os setores da sociedade serão ouvidos e terão suas contribuições analisadas com o devido cuidado (contém ironia!).
Infelizmente, no Brasil tornou-se lugar comum tratar as regras eleitorais de afogadilho, menosprezando as contribuições da sociedade civil e as reflexões apresentadas por estudiosos e profissionais da área. Não por acaso, leis são aprovadas com redações confusas e que resultam em judicialização dos resultados eleitorais, como no caso da regra da distribuição das “sobras eleitorais” quando inexistem partidos e candidatos que cumpram os critérios definidos pela Reforma de 2021. O julgamento da ADI 7263, que estava em análise no Plenário Virtual do STF, foi suspensa após pedido de vista dos ministros Alexandre de Moraes (em abril desse ano) e André Mendonça (agora no mês de agosto).
Talvez a revisão da redação que deu origem a essa disputa judicial seja um dos pontos menos controversos que o Grupo de Trabalho enfrentará. Temos que estar precavidos aos anseios dos deputados de diminuírem ainda mais a proporção mínima de mulheres compondo as listas de candidatos e correspondente destinação de recursos para o financiamento das campanhas dessas candidatas.
Por fim, temos que ficar atentos às inovações propostas sob o argumento de “simplificação” do processo de prestação de contas das campanhas. Nunca é demais lembrar que se estima que, entre recursos do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário) e o Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), espera-se que a União (e, por conseguinte, nós, contribuintes) destine mais de R$7 bilhões somente no ciclo eleitoral de 2024.
Não questionamos a legitimidade da alocação recursos públicos para o financiamento do processo eleitoral, um dos marcos mais importantes de qualquer democracia, mas não podemos aceitar que os partidos façam uso desses recursos sem respeitar regras mínimas de transparência e diversidade na alocação dos recursos.
Para que as alterações na legislação eleitoral se apliquem ao pleito municipal de 2024, elas precisam ser sancionadas até o dia 5 de outubro deste ano. Até lá, muitas matérias serão publicadas nos jornais, artigos escritos em blogs, debates feitos em podcasts e muitas noites serão passadas em claro acompanhando os debates e as votações na Câmara e no Senado.