Vítor Sandes

 

O presidente Lula formou uma coalizão multipartidária para conduzir seu governo, visando cumprir acordos e garantir a governabilidade. Considerando a atual distribuição de cargos realizada para os partidos políticos, o governo conta com o apoio de treze partidos: PT, PSB, PSD, MDB, PDT, Rede, PSOL, PC do B, PV, Podemos, Avante, Solidariedade e União Brasil (UB). Isso viabiliza, em tese, o apoio de 301 deputados federais, ou seja, um pouco mais de 58% do total.

As bancadas dos partidos não são disciplinadas a ponto de garantir que todos os deputados de uma sigla votem favoráveis a medidas de interesse do governo, isto é, o governo não pode garantir que tenha, de forma estável, mais de 50% dos votos na Câmara dos Deputados. Para completar, várias medidas de interesse do governo necessitam de alterações constitucionais, por meio da aprovação de Propostas de Emenda à Constituição (PECs), que necessitam de votos favoráveis de 3/5 do total das Casas, ou seja, de, pelo menos, 308 deputados federais Câmara dos Deputado e de 49 senadores. A solução, então, é ampliar a coalizão.

Como estratégia para a ampliação do apoio legislativo, o presidente Lula tem articulado a entrada dos Progressistas (PP) e do Republicanos no governo, que possuem, respectivamente, 49 e 41 deputados federais, totalizando 90 parlamentares na Câmara dos Deputados. Então, a solução é ceder alguns cargos e os partidos passarão a apoiar a agenda do governo? Não é tão simples assim. Inicialmente, a busca desses dois partidos seria por cargos de grande projeção política e, sobretudo, com acesso a recursos mais volumosos.

Devido às características plásticas do ponto de vista ideológico e por priorizarem cargos e recursos, os partidos do “centrão” têm o objetivo de se utilizarem da sua força legislativa para barganhar poder junto ao governo de ocasião. Ministérios como os da Saúde e Educação não parecem (ainda) estar em jogo, considerando o desejo do presidente Lula de mantê-los sobre o seu controle. Os dois ministérios possuem dotações orçamentárias bastante relevantes (cerca de 189,5 bilhões de reais e 163,7 bilhões de reais, respectivamente), além de serem responsáveis por políticas que atendem diretamente os brasileiros em suas necessidades mais prementes.

Então, sugeriu-se a entrega da pasta do Desenvolvimento Social (Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome), hoje ocupada pelo senador Wellington Dias (PT-PI), para o PP. A dotação orçamentária atual do Ministério para o ano de 2023 (cerca de 273,2 bilhões de reais) somente perde para a Previdência Social (cerca de 880,5 bilhões de reais), cujo seus recursos são destinados, quase na totalidade, para gastos obrigatórios com benefícios previdenciários.[1] O Ministério do Desenvolvimento Social controla uma série de políticas sociais, como o Bolsa Família e, por isso, é de interesse direto do presidente e do próprio PT manter o controle sobre a pasta.

Foram oferecidos outros ministérios ao Republicanos e ao PP: Portos e Aeroportos e Esporte. Em comparação às pastas do Desenvolvimento Social, da Saúde e da Educação, os ministérios oferecidos apresentam orçamentos muito reduzidos. O Ministério dos Esportes, por exemplo, tem dotação orçamentária atual para o ano de 2023 de um pouco mais de 1,2 bilhão de reais. Então, um dos possíveis acordos é que a pasta poderá receber novas atribuições e receber recursos adicionais provenientes da regulamentação das apostas esportivas.

Utilizando o Ministério do Esporte como exemplo e analisando a série histórica de 2000 a 2023, observa-se que a pasta teve um aporte de recursos muito mais relevante do que atualmente, sobretudo em governos do PT, mais especificamente, Lula 2 e Dilma 1. A partir de 2016, a dotação orçamentária teve uma queda relevante, considerando o contexto de cortes e, posteriormente, com a aprovação do “teto de gastos” (Emenda Constitucional nº 95/2016) que limitou o crescimento das despesas públicas.

Dotação orçamentária atualizada em reais do Ministério do Esporte (2000-2023).

Fonte: Dados do SIOP.

Obs: Não há dados referentes a 2019-2022, pois não havia Ministério do Esporte neste período.

Após longo processo de negociação, nesta quarta-feira, 06 de setembro, as pastas oferecidas foram aceitas pelos partidos como forma de contar com o apoio de membros de suas bancadas em votações de interesse do governo. O deputado federal André Fufuca (PP-MA) será o novo ministro do Esporte e o deputado federal Sílvio Costa Filho (Republicanos-PE), o novo ministro de Portos e Aeroportos.

Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro extinguiu o Ministério do Esporte e criou uma Secretaria Especial vinculada ao Ministério da Cidadania para tratar do tema. Em janeiro deste ano, o presidente Lula recriou a pasta e nomeou a ex-jogadora de vôlei, Ana Moser (sem filiação partidária), como ministra da pasta. Não tendo sido indicação de nenhum partido, a troca no Esporte teve menor custo político. Já a entrada de Sílvio Costa Filho levou à exoneração de Márcio França (PSB-SP) do cargo, então ministro de Portos e Aeroportos. Para reacomodar França e o PSB, será criado o Ministério de Micro e Pequenas Empresas.

Também foi aventada a possibilidade de Margarete Coelho (PP-PI) ocupar a presidência da Caixa Econômica Federal e também está em jogo a distribuição das vice-presidências do Banco. Coelho é próxima do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e de Ciro Nogueira (PP-PI), presidente nacional do Progressistas.

Por parte dos novos aliados, a expectativa é ampliar o acesso aos recursos e incrementá-los por meio da Lei Orçamentária Anual de 2024, que, inclusive, é discutida e votada pelo próprio Congresso. Já Lula e o PT conseguiram preservar seus principais cargos e passaram a obter o apoio dos novos parceiros do “centrão”. A questão é saber se a fome por cargos dos novos aliados está satisfeita ou se, em breve, um novo banquete terá que ser servido.

[1] Todos os dados sobre dotação orçamentária atual para o ano de 2023 utilizados neste texto foram extraídos do Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento – SIOP. Para mais informações, acesse: https://www.siop.planejamento.gov.br/

Créditos da imagem: Brenno Carvalho