Ji-Paraná, o domínio familiar no poder local e o retorno das crises políticas
João Paulo Viana, Patrícia M. C. de Vasconcellos, Melissa Volpato Curi e Jamila Martini
Maior cidade do interior de Rondônia, com quase 125 mil habitantes e mais de 90 mil eleitores, Ji-Paraná representa o segundo maior colégio eleitoral do estado, atrás somente da capital, Porto Velho. Município de grande importância, está situado praticamente no meio do caminho entre a capital, Porto Velho, e Vilhena, cidade rondoniense mais próxima da fronteira com o Mato Grosso. Após uma fase de relativa instabilidade política, sobretudo, entre os fins da década de 1990 e o início dos anos 2000, a próspera cidade logrou um período de considerável estabilidade, principalmente, durante as gestões de José de Abreu Bianco (pelos antigos PFL e DEM) e, posteriormente, Jesualdo Pires (PSB). Entretanto, desde a renúncia de Jesualdo, para concorrer ao Senado em 2018, o município tem passado por momentos de turbulências que, há quatro meses, com o afastamento do atual prefeito, Isaú Fonseca (MDB), sinalizaram para um iminente retorno a um quadro de instabilidade política.
Primeiro presidente da ALE-RO, ex-governador e ex-senador, o advogado José Bianco governou a cidade por três períodos, os dois últimos exercidos entre 2005 e 2012. Pedessista e peefelista histórico no estado, Bianco foi sucedido pelo engenheiro civil e ex-deputado estadual, Jesualdo Pires (PSB). Considerado um político moderado, no ano de 2016, Jesualdo foi reeleito com cerca de 70% dos votos, renunciando ao seu segundo mandato em 2018 para concorrer ao Senado Federal. Apesar de ser um dos candidatos favoritos à época, devido, sobretudo, a boa avaliação que sua administração possuía junto à população jiparanaense, o contexto que o estado vivenciava seguindo um padrão nacional de guinada à extrema direita – quadro que se perpetua em Rondônia até os dias atuais, foi fundamental para a derrota de Jesualdo naquela eleição. Cumpre mencionar que ambos, Bianco e Jesualdo, governaram a cidade com maiorias sólidas na câmara municipal e, portanto, sem graves problemas na relação com o Legislativo.
Após a renúncia para desincompatibilização de Jesualdo (PSB), o vice, Marcito Pinto (PDT), falecido há alguns dias, assumiu o cargo e governou até o dia 25 de setembro de 2020. Na ocasião, a Polícia Federal prendeu um grupo de prefeitos de importantes cidades do interior de Rondônia, durante a “Operação Reciclagem”, entre eles, Marcito que, naquele momento, afastado do cargo, não retornaria à prefeitura. Poucas semanas após o afastamento de Marcito, em 15 de novembro de 2020, Isaú Fonseca (MDB) venceria a eleição para a prefeitura de Ji-Paraná. De fato, a partir da prisão e afastamento de Marcito, uma conjuntura de instabilidade retornaria à política jiparanaense.
Eleito para o seu primeiro mandato à frente da prefeitura de Ji-Paraná, filiado ao partido mais tradicional do estado, o MDB, Isaú Fonseca foi vereador na cidade em três legislaturas, exercendo também a presidência da câmara, cargo do qual já havia sido afastado anos atrás. Em que pese contar com elevada popularidade, no dia 13 de julho deste ano, uma operação da Polícia Civil e do Ministério Público de Rondônia, com o apoio da Polícia Federal e da Polícia Civil dos estados do Acre e Goiás, denominada “Horizonte de Eventos”, afastou Isaú Fonseca, consistindo no segundo mandatário da cidade afastado do cargo pela Justiça em menos de três anos. Na ocasião, o vice Joaquim Teixeira (PL) assumiu a prefeitura, e governa a cidade até o momento, porém, rompido com o prefeito afastado e diante de um quadro de instabilidade ainda mais complexo. Importante ressaltar que na eleição de 2020, o filho de Isaú, Welinton Fonseca (MDB), popularmente conhecido como “Negão filho do Isaú”, sagrou-se também vitorioso ao seu segundo mandato na Câmara Municipal de Ji-Paraná, tornando-se, em seguida, presidente da casa.
A atual composição partidária na Câmara Municipal de Ji-Paraná encontra-se assim: MDB (2); PDT (2); PSDB (2); Republicanos (2); Solidariedade (2); União (1); PSD (1); PSB (1), Patriota (1); PTB (1); PT (1); NOVO (1). Como explicitado anteriormente, o Legislativo municipal é presidido pelo filho do prefeito eleito em 2020 e, recentemente, afastado do cargo. Ambos filiados ao MDB, Isaú Fonseca e Welinton Fonseca, comandavam os poderes Executivo e Legislativo municipais e o prefeito afastado contava com maioria significativa na câmara de vereadores. Nesse sentido, pai e filho ocupando os maiores cargos do Executivo e Legislativo municipal, denotaria uma situação a qual as instituições de controle classificariam, notoriamente, como: “fator de risco”. Em abril de 2021, com apenas quatro meses no cargo de presidente da câmara municipal, Welinton Fonseca foi reeleito para o segundo biênio, obtendo treze votos, alcançando apoio até mesmo na oposição.
Não obstante, ainda durante o período em que Isaú esteve à frente da prefeitura, a oposição, à época minoritária e de partidos ideologicamente distintos, procurava atuar de forma mais organizada em algumas votações e temas importantes. Inclusive, o próprio afastamento de Isaú deve ser creditado a atuação desse grupo na casa de leis jiparanaense. Rosana Pereira (NOVO), Brunno Carvalho (Solidariedade), Edizio Barroso (Solidariedade) e Vera Márcia (PT) eram naquele momento os principais opositores do prefeito na Câmara Municipal de Ji-Paraná. Foi de autoria da vereadora Rosana Pereira (NOVO) a denúncia que culminou com a investigação e, consequentemente, o afastamento do prefeito do cargo.
Com o afastamento de Isaú Fonseca (MDB) e a cadeira de prefeito ocupada por Joaquim Teixeira (PL), a conjuntura de instabilidade política se agravou paulatinamente. Em que pese a força do grupo do prefeito afastado e de seu filho, presidente da câmara municipal, a maioria legislativa construída por Isaú entrou em notório processo de desagregação. Diante de um quadro de profunda instabilidade na relação Executivo-Legislativo, atualmente há em curso na câmara dois processos de cassação distintos, contra o prefeito afastado e o atual prefeito. Cumpre mencionar o rompimento político de ambos. Além desses respectivos grupos, pode se considerar a existência de uma terceira força na câmara de vereadores, em oposição direta a Isaú Fonseca e também a Joaquim Teixeira. Como assinalado anteriormente, o caos político retornou ao município após cerca de vinte anos. A situação de ingovernabilidade é uma realidade da atual política jiparanaense.
Nesse contexto, a vereadora Rosana Pereira (NOVO) vem se destacando como um quadro que pode, inclusive, surpreender na corrida eleitoral à prefeitura em 2024. Obviamente que não será uma eleição fácil. Há também chances do retorno de Jesualdo Pires (PSB) à vida pública, ainda que o ex-prefeito e ex-deputado estadual tenha declarado sua vontade de se aposentar das disputas eleitorais. Outro nome que desponta como um possível ator de relevância à prefeitura de Ji-Paraná em 2024, é Laerte Gomes, ex-presidente da ALE-RO e ex-prefeito de Alvorada d’Oeste. Uma candidatura que pode contar com o apoio do atual senador Marcos Rogério (PL). Porém, tudo ainda é muito incerto, principalmente, devido ao recente agravamento da crise política.